Capítulo XI - A estrutura dos mitos. Antropologia Estrutural I

p.237 Antropologia se afastou do estudo dos fatos religiosos (etnologia religiosa). Interpretações – de Tylor, Frazer e Durkheim – passaram de moda tão rapidamente quanto os postulados psicológicos em que implicavam (psicologia intelectualista).

p.238 Psicologia modernos, por outro lado, se desinteressou dos fenômenos intelectuais e prefere estudo da vida afetiva. Reduziu-se operações mentais diferentes da nossa a sentimentos informes e confusos = fenomenologia religiosa.

Antigas interpretações dos mitos: devaneios coletivos de consciência, divinização de personagens históricos, ou o inverso. Passatempo gratuito ou forma primitiva de filosofia. Outras pretendem que no mito se revelem sentimentos comuns a toda humanidade, outros, que seria explicação para fenômenos naturais.

p.239 Psicólogos e etnólogos querem substituir interpretações cosmológicas e naturalistas por aquelas de cunho sociológico ou psicológico: mitologia será tida como reflexo da estrutura social e das relações sociais.

Antinomia fundamental da natureza dos mitos que o conteúdo dos mitos seja totalmente contingente, mas que reproduza mesmos caracteres e segundo os mesmos detalhes em diversos locais.

p.240 Crítica a Jung temas mitológicos (arquétipos) estariam ligados a significações precisas. Assim como filósofos acreditavam que diversos sons possuíssem afinidade natural com um sentido, quando, na verdade, a função significativa da língua não está ligada aos próprios sons, mas à maneira como estes se encontram combinados entre si.

Não se deve comparar mito e linguagem porque mito faz parte da língua, é pela palavra que ele se faz aparecer, provém do discurso.

p.241 Saussure separava linguagem em dois níveis temporais aos quais língua e palavra pertencem. Mito se define por um sistema temporal que combina propriedades dos dois níveis e vai para além deles.

p.241 Lingüística – língua: está em tempo reversível, é estrutura

palavra: tempo irreversível, é estatística

Mito – palavra: diz respeito a acontecimentos que aconteceram há muito tempo (histórica)

língua: estes acontecimentos, que ocorreram há muito tempo, formam estrutura permanente que se relaciona simultaneamente ao passado, presente e futuro (não histórica)

objeto absoluto: também de natureza linüística.

Revolução Francesa – palavra para o historiador: seqüência de acontecimentos passados cujas conseqüências longínquas se fazem sentir através de uma série, não reversível, de acontecimentos intermediários.

língua: seqüência de acontecimentos passados, mas também esquema dotado de eficácia permanente, permitindo interpretar a estrutura social da França atual, entrever lineamentos da evolução...

p.242 Mito modalidade de discurso onde a fórmula “tradutor, traidor” tende a zero. Valor do mito persiste mesmo com a pior traição, é percebido como mito por qualquer leitor. Sua essência não se encontra nem no estilo, nem no modo de narração, nem na sintaxe, mas na história relatada.

1) Se um mito tem sentido, este não pode ser encontrado nos elementos isolados que o constituem, mas na maneira como estes se combinam.

2) Mito é parte integrante da linguagem, mas a maneira pela qual esta é utilizada no mito, contém propriedades específicas.

3) propriedades são de natureza mais complexa que as que se encontram em uma expressão lingüística de qualquer tipo.

Conseqüências:

· como todo ser lingüístico o mito é formado por unidades constituitivas.

· elementos particulares do mito - mitemas: grandes unidades constitutivas (estão para os semantemas assim como os semantemas estão para os morfemas)

p.243 Como reconhecer e isolar os mitemas? Procurá-los no nível da oração.

1. Guiar-se pelos princípios que servem de base à análise estrutural: economia da explicação, unidade de solução, possibilidade de reconstituir o conjunto a partir de um fragmento e de prever os desenvolvimentos ulteriores a partir de dados atuais.
2. Cada mito é analisado independentemente, procurando traduzir-se a sucessÃo de frases o mais curtas possíveis. Cada frase é inscrita em uma ficha que traz o número a que corresponde o seu lugar na narrativa. Cada cartão consiste em um predicado e um sujeito = cada grande unidade constitutiva tem a natureza de uma relação.

• verdadeiras unidades constitutivas não são relações isoladas, mas feixes de relações, e que é somente sob a forma de combinação de tais feixes que as grandes unidades possuem função significante. Relações do mesmo feixe podem aparecer em intervalos afastados desde um ponto de vista diacrônico (tempo irreversível), mas se chegamos a restabelecê-las em seu agrupamento natural, conseguimos organizar o mito em função de um sistema temporal que satisfaz as exigências de conter propriedades de “língua”e “palavra”, tempo sincrônico e diacrônico.

p.250 Método nos livra do obstáculo que é estudar a versão autêntica ou primitiva. Para esse método cada mito se define pelo conjunto de todas as suas versões: mito permanece mito enquanto é percebido como tal. Análise estrutural deve considerar todas as variantes de um mesmo mito sob o mesmo título.

p.251 Para cada uma das variantes, se estabelecerá um quadro onde cada elementos será disposto de modo a permitir a comparação com o elemento correspondente dos outros quadros. Obter-se-ão inúmeros quadros de duas dimensões, cada qual consagrado a uma variante, e que se justaporão com outros tantos planos paralelos, para chegar a um conjunto tridimensional que poderá ser lido de três maneiras: da esquerda para a direita, de cima para baixo, da frente para o fundo.

p.252 O que aconteceria se uma nova versão desordenasse os resultados obtidos? A dificuldade é real quando se dispõe de um número reduzido de versões mas se torna teórica à medida que esse número se acresce. Mas não se insistirá demais sobre a necessidade de não se omitir nenhuma variante do mito. Não existe também versão verdadeira da qual as outras são cópias ou ecos deformados. Todas as versões pertencem ao mito.

p.258 Aplicando-se sistematicamento o método de análise estrutural, chega-se a ordenar todas as variantes conhecidas de um mito em uma série, formando uma espécie de grupo de permutações, onde as variantes situadas em ambas as extremidades da série oferecem, uma em relação a outra, uma estrutura simétrica mas inversa.

Introduz-se, pois, um início de ordem onde não havia senão caos, e ganha-se a vantagem suplementar de distinguir certas operações lógicas que estão no fundamento do pensamento mítico.

3 tipos de operação.

p.259 Pensamento mítico procede da tomada de consciência de certas oposições e tende à mediação progressiva. Dois termos entre os quais a passagem parece impossível, seria m inicialmente substituídos por dois termos equivalentes que admitam outro como intermediário. Após o que, um dos termos polares e o intermediário são, por sua vez, substituídos por uma nova tríade, e assim por diante.

p.260 Cadeia de mediadores oferece uma série de articulações lógicas que permitem resolver diversos problemas da mitologia americana, mas não só isso. Podem-nos fazer interrogar se não atingimos, por este meio, um modo universal de organizar os dados da experiência sensível.

Função de mediador retém qualquer coisa da dualidade que tem por função superar. Mas, trickster não é única fórmula possível de mediação, alguns mitos esgotam todas as modalidades possíveis da passagem da dualidade à unidade.